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  • Damiani Costa e Silva

Os Meios de Comunicação em Massa e Seu Impacto Sobre o Etiquetamento Social


*Texto Publicado nos anais do XVII Seminário Interinstitucional de Ensino, Pesquisa e Extensão, 2012, UNICRUZ - Cruz Alta.

Introdução

Segundo Shecaira (2008), Labelling Approach é um movimento criminológico, desenvolvido nos anos 60. Esta teoria é chamada teoria de conflito e seus autores clássicos denominados críticos. Isto porque, em sentido estrito, a perspectiva da Rotulação Social, é de fato, uma crítica ao direito penal e à criminologia tradicional.

O mundo contemporâneo é conhecido como “era da informação”. Vieira (2003) brilhantemente nos ensina que além da informação, o aspecto de liberdade de expressão em si, é uma necessidade básica do homem para que este possa se manter em sociedade, ou seja, as pessoas anseiam saber o que está acontecendo ao seu redor. Para suprir essa função, temos a tecnologia, que se desenvolveu de tal forma a eliminar barreiras e facilitar a comunicação global.

Desta feita, este trabalho de revisão bibliográfica tentará observar a existência – ou não – de uma relação entre o poder dos meios de comunicação em massa e a Teoria do Etiquetamento Social.


Noções básicas de Rotulação Social

Na teoria do Labelling Approach (também conhecida como Interacionismo Simbólico, Etiquetamento ou Rotulação Social), não são consideradas as causas primárias que levaram determinado agente a delinquir e sim, as causas secundárias, aquelas que aproximam o indivíduo de seu rótulo. O estudo do Etiquetamento analisa os processos de funcionamento do controle social em resposta às atitudes criminosas (QUEIROZ, 1988).

Para um melhor entendimento, ZAFFARONI (1996, p. 60), nos traz uma boa definição:

A tese central desta corrente pode ser definida, em termos muito gerais, pela afirmação de que cada um de nós se torna aquilo que os outros vêem em nós e, de acordo com essa mecânica, a prisão cumpre uma função reprodutora: a pessoa rotulada como delinquente assume, finalmente, o papel que lhe é consignado, comportando-se de acordo com o mesmo. Todo o aparato do sistema penal está preparado para essa rotulação e para o reforço desses papéis.

Até que ponto a mídia contribui para a reincidência delitiva?

Para responder esta pergunta, é necessário analisar a contemporaneidade e o predomínio da mídia, que está inserida no meio social internacional, aproximando povos e suas culturas. Internet, televisão ou rádio: as pessoas estão todas conectadas e suscetíveis a todo tipo de informação (ALMEIDA, 2008). Por este motivo, os meios de comunicação em massa estão assumindo uma espécie de controle social que nos torna envolvidos em um pensamento homogeneizado, regrado e extremamente limitado ao que foi abordado na mídia. Se, por um lado, ela não nos impõe diretamente um pensamento objetivo, a publicidade inconscientemente nos posiciona em uma determinada linha de raciocínio. Desta forma, a sociedade fica programada para refletir e discutir sobre temas previamente definidos (SHECAIRA; JÚNIOR, 2002).

Fatidicamente, o jornalismo jamais poderá ser desvinculado à ideia de moralidade. Portanto, toda matéria em conjunto com o que se considera realidade é embasada em um alicerce moral. Ratifica-se: a mídia tem capacidade de internalizar os conceitos que produz, e seu atual enfoque é a prática delitiva. Incontestavelmente, ainda que por razões diversas, a sociedade se interessa pela burla de regras. Então, em resumo, essa é uma forma de captar o público. A soma destes apontamentos gera o seguinte produto: os veículos de comunicação interferem com a realidade e, não raramente, deturpam o funcionamento formal do ordenamento jurídico (ALMEIDA, 2008). Trata-se de um vício. Como resultado, temos um grupo de pessoas temerosas e crentes de que vivem em uma sociedade regida pela delinquência. Finalmente, ao assimilar toda a criminalidade que lhe foi exposta, a população começa a se questionar sobre as estruturas e o funcionamento do Estado. É este grupo de pessoas quem pressiona o legislador para modificar o ordenamento jurídico. Esse, por sua vez, tende a ser cada vez mais penalizador (ZAFFARONI, 1996).

Assim, Wacquant (1999) afirma que desenvolver um sistema penal em resposta aos problemas socioeconômicos da população ao aumentar as forças coercitivas do Estado equivale a um desfavorecimento claro às classes humildes. Um exemplo deste desfavorecimento está em um preceito do Etiquetamento Social, cujo crime e delinquência não são meramente produtos da personalidade de um ser humano. Trata-se de uma definição. Afinal, a incriminação – em prática – não está focada na defesa do bem jurídico, mas sim, no interesse de um grupo discriminador (HERRERO, 1997).

Em alusão a tudo que foi exposto, Guimarães (2007) aduz que os poderes da mídia são demasiadamente arbitrários e os danos causados às pessoas relacionadas a fatos criminosos (normalmente ainda em processo investigativo) são irreversíveis. Uma vez que seja implantada uma opinião geral negativa sobre o agente, ainda que provada inocência, o mesmo estará permanentemente condenado ao seu rótulo de delinquente perante a sua sociedade. A mídia, conforme Rolim (2006, p. 188) “não está voltada, exatamente, para a realidade, mas para aquilo que, dentro dela, aparece como surpreendente”. Ou seja, como explica Baratta (1997), o direito penal não defende todos igualmente e sim os bens essenciais, haja vista que a lei penal prática é desuniforme perante a atribuição de penas a grupos distintos. Dessa forma o status de criminoso é distribuído de modo desigual entre a sociedade. Esse status será imposto sem levar em conta o dano ao bem jurídico tutelado e a gravidade da infração.


Conclusão

Seria muito insensato negar a existência do crime, que é fenômeno intrínseco à vida da sociedade. Mas este trabalho referiu-se a falsa realidade de criminalidade fora do controle em um Estado ineficaz construída através de uma mídia desrespeitosa aos padrões éticos, sensacionalista, que busca nada mais do que garantir os seus interesses. Dessa forma, a reincidência criminal, estudada pelo Labelling, certamente pode estar ligada à confusão populacional sobre as dimensões atuais dos níveis – e principalmente os padrões – de delinquência. Afinal, como visto, os veículos de comunicação usam o terror para atrair o público e esse, por sua vez, tomado por um sentimento de insegurança, exige uma resposta do sistema penal.

No topo de tudo, está uma classe marginalizada: a população pobre, alvo principal dos noticiários, principalmente pela sua facilidade de acesso. Ora, me pergunto: de que maneira um agente com dificuldades socioeconômicas, somadas a este pré-conceito regente na sociedade, será capaz de se reintegrar à mesma? Não é esta a função do Sistema Penal Brasileiro?

Concluo que atendi o objetivo deste trabalho, no sentido que através dele foi apontada a existência de uma relação entre o crime na visão da teoria do Etiquetamento e os veículos de comunicação em massa. Cabe agora, uma pesquisa mais aprofundada quanto a números e a quem esta crítica deve ser endereçada. Fica aí a oportunidade para um estudo futuro.


Referências

ALMEIDA, Judson Pereira de. Os Meios de Comunicação em Massa e o Direito Penal: A influência da divulgação de notícias no ordenamento jurídico penal e no devido processo penal. Bahia: Revista Ciência & Desenvolvimento – Revista Eletrônica da FAINOR, 2008.


BARATTA, Alessandro. Criminologia crítica ao Direito Penal. Tradução de Juarez Cirino dos Santos. Rio de Janeiro: Renavan, 1997.


HERRERO, César Herrero. Criminologia: Parte General y Especial. Madrid: Dykinson, 1997.


QUEIROZ, Paulo de Souza. Do Caráter Subsidiário do Direito Penal: Lineamentos para um direito penal mínimo. Belo Horizonte: Del Rey, 1998.


ROLIM, Marcos. A síndrome da rainha vermelha: policiamento e segurança pública no século XXI. Rio de Janeiro: Oxford, 2006.


SHECAIRA, Sérgio Salomão; JÚNIOR, Alceu Corrêa. Teoria da Pena: Finalidades, direito positivo, jurisprudência e outros de ciência criminal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.


SHECAIRA, Sério Salomão. Criminologia. 2ª ed. São Paulo: Revistados Tribunais, 2008.


VIEIRA, Ana Lúcia Menezes. Processo Penal e Mídia. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003.


WACQUANT, Loïc. As prisões da miséria. Rio de Janeiro: Zahar, 1999.


ZAFFARONI, Eugenio Raúl. Em busca das penas perdidas: A perda da legitimidade do sistema penal. Tradução de Vânia Romano Pedrosa e Amir Lopes da Conceição, 2ª ed. Rio de Janeiro: Revan, 1996.

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